sexta-feira, 16 de abril de 2010

Alice no país dos Avatares



“(...) Não esquecer que a estrutura do átomo não é vista, mas sabe-se dela. Sei de muita coisa que não vi”.

A sentença acima foi escrita por Clarice Lispector no livro “A hora da estrela”. Acabei de lê-la no trecho final da magnífica biografia escrita por Benjamin Moser, “Clarice,”.

Recorro a ela para justificar alguns pontos de vista sobre determinados aspectos da cultura da nossa época.

Acabo de ver o trailler do filme “Alice no país das Maravilhas”, do incensado diretor Tim Burton. Para mim, o trailler basta, assim como as primeiras páginas de um livro. Não gostei do que vi.

A delicada fantasia do livro foi travestida por um universo gótico, delirantemente carregado. Claro que o hype da temporada será assistir o filme com óculos 3D (o Ruy Castro outro dia escreveu que em 1955 a tecnologia já era tão obsoleta quanto o bilboquê), com ou sem aditivos químicos, e propagar e tecer loas via Twitter e Facebook sobre a atuação chapada do Johnny Depp como o Chapeleiro Maluco.

Você compra o pacote fechado. Um combo, pipoca, chocolate e refrigerante: Alice + 3D + Johnny Depp o-senhor-doidão-de-Hollywood+ Tim Burton. Sucesso de bilheteria antes da estreia. Sei de algumas coisas que não vi por inteiro.

Parece que vou assistir “Crônicas de Nárnia” ou o “Senhor dos Anéis”. Uma sensação de "Dejá Vú de Cinemark", conhece essa sensação?

Os filmes não têm especificidade, não tem fantasia, não tem uma visão original (não precisa ser fidedigna) sobre a obra. Há preguiça mental por parte dos espectadores, pois pensam que a fantasia & o universo onírico só podem ser supridos por toneladas de efeitos especiais, maquiagens futuristas, etc. Perde-se o encanto, a SUTILEZA.

Mas o kitsch predomina. Walt Disney, vocês esperavam o quê?

Por exemplo: o diretor Ridley Scott, em “Blade Runner”, utiliza a ficção científica e os efeitos especiais com maestria, pois tinha algo a dizer sobre a distopia do livro que inspirou o filme. Isso é arte. Mas, se querem entretenimento besuntado de manteiga, tecnologia, e dólares, ok. Alice comporta todos esses quesitos.

E , só pra constar, a música da trilha sonora que está sendo "trabalhada" comercialmente é da musa adolescente Avril Lavigne. Legal né? E uma versão de "Whitte Rabitt", do Jefferson Airplane, por "Grace Potter and the Nocturnals", manja? Ah, e tem a banda mais poser da história, o "Tokyo Hotel", um híbrido horrendo de hair metal, emo e animé japonês. E o clássico gótico Robert Smith. Bom, Tim Burton tem mesmo um pé na cova, e quis fazer um filme que dissesse mais sobre seus gostos do que sobre a obra de Lewis Carrol.

Resumindo: talvez por isso “Avatar” tenha feito aquele sucesso de bilheteria, mas fracassou no Oscar. O geek James Cameron sabe o que a plateia deseja. Quando vi o trailler daqueles horrendos monstros kitsch, azuis e com cara de cavalo, falei pra mim mesmo: Não, obrigado. Cansei.

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